Bolo de Discos
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Por vezes, as receitas culinárias dão muitas voltas. Como foi referido a propósito dos biscoitos milhas, as famílias deslocam-se, as pessoas casam-se, amigos e familiares trocam receitas, mulheres tornam-se freiras e levam receitas de casa, freiras transferem-se de um convento para outro, pessoas acolhidas em conventos e empregadas de casa ricas aprendem receitas, estas pessoas, por sua vez, também casam, têm filhos, mudam de localidade, trocam receitas, e assim sucessivamente. Pense-se nisto no decurso, digamos, de cinco gerações e imagine-se ao longo de séculos. Ora, a história do bolo de discos é algo intricada.
- A receita não é propriamente segredo: a câmara municipal local tem-na, há particulares na região que a conhecem e alguns restaurantes e pastelarias do concelho fazem-na. Todavia, a referência actual do bolo de discos, nos Arcos, é a doceira Rosa Maria, que nos conta, com alguma emoção, que aprendeu a fazê-lo com a falecida Sara Barreiro, uma doceira muito conhecida por ali. Esta senhora, por sua vez, aprendera com a Sidónia Ferreira de Araújo lobato, de quem era amiga e vizinha. A família Ferreira de Araújo de Melgaço e mudou-se para Arcos de Valdevez em finais do séc. XIX. Provavelmente, já teria a receita nessa altura, até porque algumas pessoas referem o bolo de discos como sendo feito também nas zonas de São João da Madeira e Oliveira de Azeméis, de onde era originário um dos membros da família Ferreira Araújo.
Em 1932, outro membro desta família, Ludovina, vai para Belém do Pará, no Brasil, e é então que a receita ganha maior relevância. Para Ludovina, levar consigo receitas de casa e depois fazê-las num paradeiro distante era uma maneira de recuperar a família e Portugal da distância. De tal modo assim foi que, nas visitas à família em Arcos de Valdevez, o doce tornou-se presença constante. É por isso que Sidónia começa a fazer o bolo, por tradição, em dias de festa, conforma recorda a sua neta, Teresa Lobato. E é assim que chegamos à amiga e vizinha doceira mais conhecida do bolo de discos nos Arcos, Rosa Maria.
- Antes de Rosa Maria, o nome que davam a este doce era o bolo de claras e amêndoas, conforme consta no livro de receitas dos Ferreira de Araújo, ou, como Tereza Lobato sempre ouviu na família, bolo de camadas. Com efeito, é um doce composto por doze discos em camadas, cada um feito com, um merengue de amêndoa e claras em castelo, que vai ao forno a cozer numas formas rasas, redondas, com pega comprida (parecem pequenas raquetes de metal), mandadas fazer especialmente para este bolo. À parte, faz-se um doce de ovos a preceito e, de seguida, basta montar o bolo, aplicando o doce de ovos entre cada um dos doze discos. O último leva por cima uma generosa camada de açúcar em pó.
Entretanto, Rosa Maria alterou ligeiramente a receita para tornar o bolo menos calórico, mais equilibrado, e explicou-nos que o número de discos, doze, deve-se apenas ao facto de ser essa a quantidade ideal, segundo a experiência, para formar um bolo consistente que se possa fatiar e servir.